O caminhar como prática do pensamento: pensar através de um lugar Ações e reflexões das práticas e problemáticas artísticas como consequência do caminhar
[S I N O P S E]
Os lugares são o que fazemos deles, são efeito do nosso estado psicológico e físico. Somos capazes de alterar um lugar através das nossas próprias experiências de vida, através das nossas experiências desse lugar, da nossa vivência. As paisagens passam a ser vividas e não apenas observadas, o que permite a sua participação também no processo de pensamento e não apenas no processo plástico de um artista.Ao atravessar fronteiras geográficas/politicas/sociais o artista permite-se divagar e travessar os seus próprios limites conceptuais e plásticos. Há um crescimento conceptual do artista que se apresenta como consequência do exercício do caminhar.
[D E S E N V O L V I M E N T O]
Partindo do pensamento de que um artista deve ser capaz de entender e exprimir o seu olhar sobre o mundo, nasce a vontade de utilizar o mundo, o lugar, no processo de pensamento. É através dele que o artista reflete e aumenta o seu entendimento das problemáticas artísticas que moldam o seu olhar sobre si, sobre o mundo e sobre as suas ações através do lugar.É através da ação do caminhar, da travessia de uma paisagem, que esta reflexão é levada ao seu expoente. No entanto para que tal aconteça é necessário que este exercício seja feito com um estado de espirito e com objetivos precisos, caso contrario tornar-se-á uma ação meramente quotidiana, caminhar por caminhar, deixando para trás todo o seu propósito conceptual.Uma das questões que se mostra mais importante neste projeto é a materialização do mesmo, já que caso contrário pode cair no erro de uma ultraconceptualidade que o posicionará mais próximo da critica da arte do que de um ‘objeto’ artístico. Lucy Lippard, no texto “A desmaterialização da arte”, fala-nos sobre a possível junção do trabalho de um escritor com o de um artista num só individuo.Este é um projeto tenta levar ainda mais além o processo de trabalho destas duas práticas, tornando a escrita um objeto plástico e as ações do artista numa narrativa. “Com o termo “percurso” indicam-se ao mesmo tempo, o ato da travessia (o percurso como ação do caminhar) e o relato do espaço atravessado (o percurso como estrutura narrativa)” (Careri, [2002]:31). O percurso como estrutura narrativa não exclusiva ao espaço real, mas também ao espaço pessoal/de pensamento do artista durante o percurso/travessia/trajeto.A escolha da paisagem a atravessar é o ponto de partida para esta ação do pensamento. A falta de novas informações no lugar, isto é a familiaridade do artista com o lugar, é da maior importância para este projeto. Caso contrário, todos os elementos (visuais, sonoros, olfativos, etc.) que se apresentem como novos na vida do artista irão sobrepor-se ao seu objeto de pensamento durante a travessia do lugar.
[M A T E R I A L I Z A Ç Ã O]
Para que a realização deste projeto seja possível irei trabalhar principalmente através de várias travessias no território escolhido (trajetos que ligam o Cais do Lugan, junto ao rio Douro na margem de Vila Nova de Gaia e a minha residência, Quinta de Forbes, Arcozelo, Praia da Granja) – um território que me é familiar – fazendo o seu mapeamento.Contudo fugindo do tradicional conceito de mapa, intimamente ligado às questões urbanas e geográficas, e aproximando-me no seu lado mais conceptual e espiritual.Recorrendo a várias ações durante essas travessias: marcação de pontos no território deixando neles um objeto que os distingue – pano bordado, inspirado em questões de mapeamento e de “ponto de encontro”; recolha de elementos fotográficos; recolha de som – paisagem sonora – e todas aquelas que se mostrarem pertinentes com o desenrolar do projeto sempre em conjunto com uma pesquisa de autores de referência para a parte teórica do mesmo.Uma possível finalização deste projeto, apesar de ainda inserta, será a apresentação de todo o processo e reflexões consequência do mesmo que poderá seguir dois caminhos distintos (que poderão ou não se juntar): uma primeira abordagem seria uma instalação com todos os elementos ilustrativos do processo; já uma segunda seria um livro-objeto – ancorado em referências como “Caixa verde” (1934) de Marcel Duchamp e o livro-objeto da obra “Buenos Aires Tour” de Jorge Macchi.
[R E F E R Ê N C I A S]
Careri, Francesco; "Walkscapes: o caminhar como prática estética" (2002)/ Prefácio de Paola Berenstein Jacques e Gilles Tiberghien; [tradução Frederico Bonaldo]. I ed. São Paulo: Editora G. Gili, 2013.
Lippard, Lucy; Chandler, John; "A desmaterialização da arte" (1968); Art International, n.12, fevereiro de 1968: 31-36 [tradução Fernanda Pequeno e Marina P. Menezes de Andrade/ revisão técnica Tadeu Capistrano]
Lippard, Lucy; "The Lure of the Local: senses of space in a Multicentered Society"(1997); The New Press, Nova Iorque
Kwon, Miown; "Um lugar após o outro: anotações sobre site-specificity"(1997); October 80, primavera,1997 85-110 [tradução Jorge Menna Barreto/ revisão técnica Paulo Roberto Stolz e Ivair Reinaldim]