Ausências Muito de nós é adição, uma adição de ausências. Nesse sentido seremos coleccionadores de esquecimentos, esquecimentos temporários, intermitentes ou permanentes. Os permanentes talvez nunca tenham existido, pois são um vazio, uma falta que nos faz falta e que está preenchida de ‘ses’. Numa existência ou numa ausência, o espaço como um sítio, é um elemento de definição. Assim como o corpo-passado e as suas manifestações nesses sítios, são fantasmas que definem essa ausência. A ausência é uma essência do viver conforme o conhecemos, logo uma essência de nós. A marca ausente pode passar pela percepção do invisível, ou pela percepção imaginativa do que existiu ou possa ter existido. Consequentemente há um elemento-fantasma do qual nos apercebemos e ao qual podemos dar vida.
Peças
Rosebud, 2021 Dispositivo e projecção. Madeiras de pinho e cerejeira, cabedal, latão, cobre e componentes electrónicos. dimensão variável .
Inicia-se uma jornada, uma aproximação ao que nunca se conheceu, a um algo perdido no tempo. Será uma peregrinação entre dois pontos precisos. Este solo, estas pedras e estas árvores, conheceram vidas, fizeram parte delas. Para ouvir estas árvores, este vento, construí este dispositivo, para os ouvir e falar com eles. Talvez me sussurrem notícias dos meu antepassados. Pergunto pela minha avó paterna, figura que em mim parece nunca ter existido, mas não é verdade, e a prova é o estar a realizar esta jornada. É o querer fazer parte da história destes elementos, deste caminho, um caminho que me reconheça, e que me aproxima de um significado mais clarificador do existir.
Café com leite, 2021 Madeira de pinho e velatura a alvaiade. 70x50x50 cm Fala-se da reunião à volta de uma mesa. Dos mimos da matriarca da família, transformados em biscoitos e café com leite. Histórias à volta de um miúdo que para se sentir grande queria café no seu leite, como a irmã mais velha. A mesa é uma réstia sugada e um objecto cortado por um canto. Afigura-se numa anomalia espaço-tempo. Qualquer canto serve para projectar esse pedaço de mesa, essa memória, essa perna e veios, essa avó e esses netos.
Pandora, 2021 Argila elaborada e solo. 50x50x70 cm
O mistério é uma ausência, uma caixa repleta de muito que não se pode aceder. A figura de uma caixa de pandora, onde a esperança reside em múltiplas imaginações de momentos. Essa figura, a geometria da casa onde nasceu a minha avó paterna, executada em argila elaborada com o solo local. A terra do local onde ela viveu como uma ampulheta do tempo, um percurso. A matéria, essa que nega acesso ao seu interior, num incrustar e petrificar de um tempo, num objecto que ficará preso juntamente com as suas memórias. Se um dia esse contador for quebrado na plenitude da ausência e do vazio, talvez a esperança seja libertada.